Receita
para um bolo refinado e gostoso:
Junte uma casa construída na época do
Renascimento, cheia de objetos de arte por todos os cômodos, uma tradição
secular de cozinhar pratos a partir das várias influências culturais, uma jovem
cozinheira que não fala português, um brasileiro que não fala italiano, 4 ova - solo tuorli, zucchero, marsala,
panna montata, cacao, alquermes, savoiardi (4 ovos, açúcar, biscoito, licor,
chocolate, cola de peixe e conhaque).
Comece se enrolando todo sem entender bem como os
ingredientes são misturados. Irene, a jovem mestre cuca, pediu que eu usasse um
avental e, de súbito, reclamou do ângulo que eu mexia os ovos, risos.
Depois, por eu ter colocado todos os ovos com a clara e não apenas as gemas,
alterou substancialmente a consistência do creme. O problema foram os
micro-grumos. A coloração ficou feia. Pronto!!! Quando Irene percebeu que a
coloração e a consistência não eram adequadas, decidiu fazer tudo de
novo.
- Speta
Irene, Speta!!! Disse eu tentando
acalmá-la e tentando entender o que havia feito de errado. Aí, apareceu Cesare,
Anna e Carlo, todos falando italiano muito rapidamente, discutindo
aristotelicamente o problema da coloração e da consistência e o quanto a
angulação que eu havia mexido os ovos alteraria substancialmente o sabor.
Refeito o procedimento, terminamos o bolo.
Depois foi a vez do jantar. Muitos italianos juntos, 8
garrafas de vinho e o assunto como sempre: comida. Disse que havia adorado o
pesto de Gênova. Resposta: – “Óbvio,
o melhor manjericão tem que nascer em regiões próximas ao mar e olhar
para ele”. Exatamente!!! Manjericão, bom é o que olha para o
mar!!!!!!
Meu amigo Cesare, excelente cozinheiro, havia feito de
antepasto (na Itália, como na França, existem 2 ou 3 entradas antes
do prato principal) maravilhosos bolinhos de jerimum, impecáveis. Sabe quanto a
italianada classificou? Nota 6. Isso mesmo, apenas 6 de média.
Quanto aos vinhos, eu mesmo fui à adega e escolhi alguns
franceses e italianos. Sabe o que disseram? Não eram tão bons quanto os de
Carpi, região de onde todos eles eram.... Risos. E olha que escolhi um italiano Pinot Noir, minha uva
preferida, sensível, delicada e absolutamente singular. Estava excelente.
O segundo prato foi uma espécie de arroz com camarão frito
com folhas de verva.
Maravilhoso!!!! O problema é que não foi aprovado porque consideraram aquele
prato muito próximo a uma massa, Cesare não havia dito que o segundo prato era
uma massa. Risos. Essa discussão se o prato era uma massa ou não durou algo em
torno de 30 minutos, com muita gesticulação de braços.
O terceiro e último prato foi um .... não quis dizer se era
maravilhoso ou não, mas era carne de Cervo. Esperei primeiro eles darem
opinião. Dessa vez elogiaram, sem olvidar, claro, uma espinafrada: – “A carne
era tão boa que qualquer cozinheiro acertaria fazê-la”. Risos.
Por fim, como sobremesa, o tão esperado Montecuccoli feito a quatro mãos, minhas e as
da Irene. Aprovaram...... Risos.
Ficamos umas quatro horas na mesa, depois das brincadeiras
sobre a aprovação ou não dos pratos, começamos a discutir política e o futuro
da Itália, além da situação brasileira.
Na Itália, assim como em outros lugares, existe uma
sociabilidade da mesa; ali há um agrupamento em que as relações pessoais se
estreitam, amizades são solidificadas, novas são feitas, e a pressa é
definitivamente inimiga da perfeição.
Comer é apenas um pretexto para se socializar. É uma pena
que a aceleração da vida moderna nos obrigue a degustar tudo muito rapidamente
em fast food.
Nenhum comentário:
Postar um comentário